Bíblia e Homossexualidade

Bíblia e Homoafetividade I* Gênesis – A Criação

Criação de Adão – Michelangelo
       Pesam sobre nós as acusações de que distorcemos a Palavra de Deus como apoio aos nossos interesses e objetivos. Em virtude disso, em nossas e reflexões, lançaremos mão das principais regras da Hermenêutica, ciência responsável pela análise, compreensão e interpretação das Sagradas Escrituras.
     É comum ouvirmos a frase, em tom sarcástico: “Deus criou Adão e Eva e não Adão e Ivo; Deus criou homem e mulher.” Não temos dúvida de que tal afirmação é verdadeira, os homossexuais ou são homens ou mulheres. Fomos todos feitos à imagem e semelhança do Criador! Aleluia!
      “Criou Deus, pois, o homem à sua imagem e semelhança, à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou” Gênesis 1.27
       A sexualidade humana é algo complexo e vai além das noções de masculino e feminino, vai além da noção de homem e mulher. No ato da criação, observamos uma das principais funções do seres humanos naquele momento: a procriação e o povoamento da Terra.
       “E Deus os abençoou e lhes disse: Sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra e sujeitai-a…” Gênesis 1.28a
      Diante desse fato, concluímos que o texto de Gênesis é uma descrição do que se vê como padrão para a maioria e não uma prescrição daquilo que deve ser obedecido por todas as pessoas, até porque seria natural hoje em dia que irmãos se casassem com irmãos, o que não é natural nem aconselhável. Da mesma forma, surgem outras questões: Será que os que escolhem permanecer solteiros estão em pecado por não se casarem? (Deixará o homem pai e mãe e se unirá à sua mulher… Gn 2.24). Será que as pessoas inférteis estão em pecado por sua incapacidade de gerar filhos e encher a terra? Certamente que não. O contexto envolvido na criação é único, a realidade atual é um contexto bem diferente daquele. Transportar a descrição do Gênesis como regra para os dias atuais seria uma incoerência. Deve-se levar em conta, também, o fato de que a Bíblia foi escrita num contexto patriarcal, culturalmente heterossexualista.
      Muitos homossexuais, desconhecendo certas verdades bíblicas, motivados pelas crenças generalizadas do Cristianismo tradicional, entregam-se ao casamento heterossexual, têm filhos, têm companhia, agem conforme o texto do Gênesis, mas são infelizes, pois lutam contra um sentimento que lhes é inerente, lutam contra uma situação que lhes foi imposta pela sociedade, abrem mão de suas necessidades para satisfação da família, dos amigos, da igreja. O resultado disso é a infelicidade, a frustração e, em muitos casos, infidelidade e depressão. O próprio Jesus afirmou que o casamento heterossexual não era para todos:
      “…Disseram-lhe seus discípulos: Se assim é a condição do homem relativamente à mulher, não convém casar. Ele, porém, lhes disse: Nem todos podem receber esta palavra, mas só aqueles a quem foi concedido. Porque há eunucos que assim nasceram do ventre da mãe; e há eunucos que foram castrados pelos homens; e há eunucos que se castraram a si mesmos, por causa do reino dos céus. Quem pode receber isto, receba-o.” Mateus 19.10, 11 e 12
      Sobre essas palavras de Jesus, trataremos posteriormente.
     Todos os homens são obra das mãos de Deus, independentemente de sua afetividade, de seus sentimentos. Será que Deus criaria alguns predestinados à condenação? Ao inferno? Certamente que não. Os avanços da ciência já comprovam que a sexualidade não é algo adquirido ou aprendido. Quem ensinaria seu filho a ser gay ou quem escolheria essa condição em uma sociedade tão preconceituosa? Ninguém, certamente. Assim como a heterossexualidade, a homossexualidade é inerente ao ser humano. Nem todos, porém, são homossexuais em sua essência. Há casos em que pessoas heterossexuais se envolvem em práticas homossexuais motivadas por vários fatores que não a sua sexualidade inata. Abordaremos isso quando chegarmos às Cartas Paulinas.
      Todas as pessoas são capazes de amar outra, com intensidade, com sinceridade. O amor e a capacidade de amar provêm de Deus:
     Amados, amemo-nos uns aos outros; porque o amor é de Deus; e qualquer que ama é nascido de Deus e conhece a Deus. 1João 4.7
    O que Deus condena é a fornicação, a prostituição e todo pecado que visa somente à satisfação física e carnal. Deus jamais condenaria o amor entre iguais, uma relação baseada em consentimento mútuo, fidelidade, respeito e sentimento. Portanto, não tenha medo, nem se sinta fora do plano de Deus para sua vida afetiva! Não se prive de vivenciar o amor, pois o amor vem de Deus! Aleluia!
(Estudo completo no livro “Bíblia e homossexualidade: verdade e mitos”. Aguardem!)
¹Alexandre Feitosa é presbítero da Comunidade Família Cristã Athos, atua na área de estudos bíblicos e como ministro de louvor.

Bíblia e Homoafetividade II Sodoma e Gomorra: violência e falta de hospitalidade

A destruição de Sodoma e Gomorra, de Gustave Doré
Há muitos séculos se tem atribuído a destruição de Sodoma e Gomorra à homossexualidade. Porém, um estudo atento do texto bíblico tem muito a nos revelar sobre as reais transgressões dessas duas cidades antigas. Neste caso, a regra de ouro da hermenêutica (a Bíblia explica a própria Bíblia) será nossa principal ferramenta de análise e interpretação. O uso da palavra sodomia como referência a atos homogenitais data da Idade Média e foi um conceito cunhado pelo teólogo Tomás de Aquino.
Vejamos o que nos diz o mais conhecido e utilizado relato sobre Sodoma e Gomorra. As partes em negrito merecem destaque:

1) Ao anoitecer, vieram os dois anjos a Sodoma, a cuja entrada estava Ló assentado; este, quando os viu, levantou-se e, indo ao seu encontro, prostrou-se, rosto em terra. 20) E disse-lhes: Eis agora, meus senhores, vinde para a casa do vosso servo, pernoitai nela e lavai os pés; levantar-vos-eis de madrugada e seguireis o vosso caminho. Responderam eles: Não; passaremos a noite na praça. 3) Instou-lhes muito, e foram e entraram em casa dele; deu-lhes um banquete, fez assar uns pães asmos, e eles comeram. 4) Mas, antes que se deitassem, os homens daquela cidade cercaram a casa, os homens de Sodoma, tanto os moços como os velhos, sim, todo o povo de todos os lados; 5) e chamaram por Ló e lhe disseram: Onde estão os homens que, à noitinha, entraram em tua casa? Traze-os fora a nós para que abusemos deles. 6). Saiu-lhes, então, Ló à porta, fechou-a após si 7. e lhes disse: Rogo-vos, meus irmãos, que não façais mal; 8- tenho duas filhas, virgens, eu vo-las trarei; tratai-as como vos parecer, porém nada façais a estes homens, porquanto se acham sob a proteção de meu teto. 9) Eles, porém, disseram: Retira-te daí. E acrescentaram: Só ele é estrangeiro, veio morar entre nós e pretende ser juiz em tudo? A ti, pois, faremos pior do que a eles. E arremessaram-se contra o homem, contra Ló, e se chegaram para arrombar a porta. (ARA)
      Alguns pontos sobre esse texto devem ser considerados: 1)Todos os homens daquela cidade cercaram a casa de Ló (4); 2) Eles exigiam que os estrangeiros (anjos) que ali estavam fossem postos para fora a fim de que fossem abusados(5); 3)Os sodomitas nutriam sentimento de xenofobia (9).
    O texto revela claramente uma tentativa de violência sexual coletiva aos visitantes de Ló motivada pela xenofobia. Naquele sociedade patricarcal,  dominada pelos homens, os habitantes de Sodoma desejaram submeter os estrangeiros à situação mais humilhante que um homem poderia experimentar: ser usado como uma mulher; transgrediram, assim,  violentamente a lei da hospitalidade, sagrada para os povos semíticos (Êxodo 22.21). Na tentativa de humilhar os visitantes,  mostraram-se maus, arrogantes e soberbos. Enxergar homoafetividade em tal gesto de violência demonstra uma completa ignorância ao que de fato a Bíblia diz. Se uma leitura atenta desse relato não bastar para se compreender o real pecado dessas cidades, examinemos outros textos bíblicos:
   Ezequiel 16.49 e 50:
49)Eis que esta foi a iniqüidade de Sodoma, tua irmã: soberba, fartura de pão e próspera tranqüilidade teve ela e suas filhas; mas nunca amparou o pobre e o necessitado. 50) Foram arrogantes e fizeram abominações diante de mim; pelo que, em vendo isto, as removi dali.
Lucas 10. 10-12:
10) Quando, porém, entrardes numa cidade e não vos receberem, saí pelas ruas e clamai: 11) Até o pó da vossa cidade, que se nos pegou aos pés, sacudimos contra vós outros. Não obstante, sabei que está próximo o reino de Deus. 12) Digo-vos que, naquele dia, haverá menos rigor para Sodoma do que para aquela cidade.
      O profeta Ezequiel, em harmonia com o relato de Gênesis, aponta o orgulho e o egoísmo como pecados de Sodoma. O mesmo profeta também fala de “abominação”, que neste caso refere-se à idolatria, como indicam as 9 ocorrências dessa palavra no mesmo capítulo. No texto de Lucas, Jesus faz um alerta sobre a recusa das boas-novas pelas cidades às quais os discípulos seriam enviados e como exemplo dessa falta de hospitalidade ele utilizou a cidade de Sodoma.  Nenhuma palavra sobre homoafetitivade consta em tais textos. Há, porém, uma clara indicação acerca da rejeição aos mensageiros de Deus. A correlação entre o Evangelho e Sodoma é a atitude daqueles que rejeitam o estrangeiro, desprezando os mensageiros divinos.
      Até mesmo os livros deuterocanônicos* (das edições católicas) expressam a mesma idéia sobre Sodoma e Gomorra:
    Eclesiástico 16.8
    “Não poupou os concidadãos de Ló, aos quais detestou por seu orgulho.”
    Sabedoria 19.13-17
    “13) Sobre os pecadores, porém, caíram os castigos de raios violentos, não sem as advertências que antes lhes tinham sido feitas; mas sofriam justamente por causa de suas próprias maldades, por terem praticado a mais detestável falta de hospitalidade. 14) Houve quem não acolhesse visitantes desconhecidos; outros reduziram à escravidão esses hóspedes que lhes faziam bem. 15) E não só isto: se ainda se aguarda julgamento contra aqueles que receberam com hostilidade a estrangeiros, 16) quanto mais contra os que atormentaram com cruéis sofrimentos aqueles a quem tinham recebido com alegria e que haviam participado dos mesmos direitos! 17) Por isso, foram feridos de cegueira como aqueles, à porta do justo, quando, envolvidos em densas trevas, cada qual procurava a direção da sua casa”. (CNBB)
    Há outros textos bíblicos que confirmam que os pecados de Sodoma e Gomorra nada tinham a ver com a homossexualidade.
   *Tais livros não constam da Bíblia protestante pois não se reconhece neles a inspiração divina, porém, constituem documentos valiosos no que diz respeito a fatos históricos.
   (Estudo completo no livro “Bíblia e homossexualidade: verdade e mitos”. Aguardem!)


Bíblia e Homoafetividade III Levítico: Os cananeus e a prostituição cultual

      Outro texto largamente utilizado para condenar os homossexuais é Levítico 18.22 e 20.13:
     “Com homem não te deitarás, como se fosse mulher; abominação é”. (18.22 ARA)
     “Se também um homem se deitar com outro homem, como se fosse mulher, ambos praticaram coisa abominável; serão mortos; o seu sangue cairá sobre eles.”. (20.13 ARA)
     Existem vários pontos a se considerar sobre esses versículos, entre eles: se existe condenação à homoafetividade, por que o sexo entre mulheres não foi mencionado? Por que as igrejas cristãs tradicionais não defendem a morte para os homossexuais? O texto é bem claro ao impor a morte àqueles homens que praticassem atos homogenitais (20.13b). Não o fazem porque interpretam alguns textos de forma seletiva, utilizando versículos e trechos isolados, violando a regra da contextualização. Nos textos em questão, o descumprimento das leis da Hermenêutica pela maioria dos cristãos é incontestável, pois desconsideram grande parte dos mandamentos ali contidos, como, por exemplo, a proibição de comer gordura (7.23), mariscos (11.12) ou de usar roupas de diferentes tecidos (19.19). É muito fácil defender um dogma considerando-se apenas uma parte isolada de um texto.
     O texto original diz, literalmente, “com outro homem não te deitarás como o deitar de uma mulher”.  Fica claro, na forma como o texto original foi escrito, tanto em 18.22 como em 20.13, que, embora o pecado seja cometido por duas pessoas, tal condenação está centrada no papel passivo da relação homogenital. Como exposto no estudo anterior, tal papel era sinônimo de submissão e ultraje para qualquer homem, pois o tornava semelhante a uma mulher. Era assim que os prostitutos cultuais dos templos pagãos se submetiam às relações sexuais de seus rituais. Israel fora chamado para ter supremacia sobre os outros povos (Deuteronômio 28.1 e 13). Qualquer ato que significasse subserviência ou humilhação não seria tolerado. Vejamos alguns pontos importantes do texto em questão:
     1) “Não imiteis as práticas do Egito onde moraste. Não imiteis as ações que se praticam em Canaã, aonde vos estou levando; não sigais os seus costumes. 21) Não darás nenhum de teus filhos para os fazeres passar pelo fogo a Moloque, nem profanarás o nome de teu Deus; eu sou Jeová. 22) Não te deitarás com homem, como se fosse mulher; é uma abominação. 23) Nem te deitarás com animal, para te contaminares com ele, nem a mulher se porá perante um animal, para ajuntar-se com ele; é confusão. 24) Não vos contamineis com nenhuma dessas coisas, porque é assim que se contaminaram as nações que vou expulsar diante de vós. 27) Porque todas estas abominações fizeram os homens desta terra, que nela estavam antes de vós; e a terra foi contaminada. 29)Porém, qualquer que fizer alguma destas abominações, sim, aqueles que as fizerem serão extirpados do seu povo.”(Levítico 18 ARA)
     O texto bíblico (v.1) refere-se a todos esses atos como práticas e costumes cananeus, indicando algo que vai além de condutas esporádicas, de uma pequena parcela da comunidade, como as relações homoafetivas. Segundo as pesquisas, os homossexuais estão estimados entre 5% a 10% da população e apenas uma parcela desse percentual encontra-se em situação de união monogâmica estável. As práticas relatadas em Levítico 18 eram costumeiras naqueles povos e algumas delas estavam associadas a ritos religiosos. Algumas expressões do texto em estudo revelam que todas essas práticas faziam parte do cotidiano dos povos cananeus, não eram condutas isoladas, mas algo generalizado como indica a sentença “a terra foi contaminada” (v.27b).
      É interessante notar que a lista de proibições sexuais muda drasticamente quando o versículo 21 introduz a proibição das práticas idolátricas, neste caso, a devoção ao deus Moloque, uma divindade conhecida pelos seus ritos licenciosos e pelo sacrifício de crianças. Em seguida, surgem as proibições aos atos homogenitais entre homens e às práticas sexuais com animais.
Nos capítulos 18 e 20, há referências às práticas sexuais dos cananeus como “leis ou estatutos” daquelas nações (18.30; 20.22 e 23), o que confirma a forte ligação desses costumes com a cultura, as divindades e os rituais locais. Jeová ordenou que Israel seguisse suas leis e seus estatutos, não as leis e estatutos dos deuses pagãos. Percebemos, pela leitura de Levítico 18.21-24, que Deus deseja preservar Israel das práticas sexuais idolátricas dos povos estrangeiros que havia na terra de Canaã:
       “Portanto guardareis o meu mandado, não fazendo nenhum dos estatutos abomináveis que se fizeram antes de vós, e não vos contamineis com eles: Eu [sou] o Senhor vosso Deus.” (18.30 ARC)
     “Guardareis todos os meus estatutos, todas as minhas normas e os porei em prática; assim não vos vomitará a terra à qual vos conduzo para nelas habitardes. Não seguireis os estatutos das nações que eu expulso de diante de vós, pois elas praticaram todas estas coisas e, por isso me aborreci delas.” (20.23 e 23 BJ)
        Em Deuteronômio 23. 17 e 18, encontramos uma clara alusão a esse tipo de ritual:
17) “Não haverá mulher israelita que se prostitua em rituais (qedesha), nem haverá quem faça isso entre os homens israelitas (qedesh). 18) Não trarás o salário da prostituta (qedesha) nem o pagamento do prostituto (keleb) para a casa do Senhor teu Deus para pagar voto algum, pois essas duas coisas são abominação (toevah) para o Senhor teu Deus”.
         As religiões cananeias enfatizavam a capacidade reprodutora da terra, as colheitas e tudo que estava ligado à fertilidade, visto que aqueles povos eram essencialmente agrícolas.
           Essa ênfase explica a importância dos intercursos sexuais em suas cerimônias. Seus cultos incluíam ritos, muito comuns naquelas religiões, como a prostituição sagrada ou cultual, rituais em honra à fecundidade, celebrados com práticas orgíacas, principalmente em devoção aos deuses Moloque, Milcom, Astarote e Baal. Escavações arqueológicas revelaram que os seus templos eram centros de vícios orgíacos, com sacerdotes agindo como prostitutos homossexuais e sacerdotisas prostitutas.
       O sexo em nossa cultura não constitui elemento vinculado a rituais religiosos, exceto em circunstâncias muito específicas. Nenhuma forma de sexo, hoje, seja homossexual ou heterossexual, tem a conotação cultural ou religiosa proibida em Levítico. Assim, tal código torna-se irrelevante para direcionar ou prescrever uma conduta heteronormativa.

Bíblia e Homoafetividade IV Coríntios e Timóteo: Prostituição masculina, devassidão e sexo abusivo entre homens

Ruínas de Corinto

Dois textos bastante utilizados para condenar a homoafetividade encontram-se em:
1 Coríntios 6.9 9 – Ou não sabeis que os injustos não herdarão o reino de Deus? Não vos enganeis: nem impuros, nem idólatras, nem adúlteros, nem efeminados, nem sodomitas,
10 – nem ladrões, nem avarentos, nem bêbados, nem maldizentes, nem roubadores herdarão o reino de Deus.
1 Timóteio 1.10:
9 – tendo em vista que não se promulga lei para quem é justo, mas para transgressores e rebeldes, irreverentes e pecadores, ímpios e profanos, parricidas e matricidas, homicidas,
         10 – impuros, sodomitas, raptores de homens, mentirosos, perjuros e para tudo quanto se opõe à sã doutrina.
        A grande chave para se rejeitar esse texto como referência à homossexualidade é a dificuldade em saber com certeza o significado das palavras aí traduzidas como “efeminados” e “sodomitas”. Tais palavras no original grego são, respectivamente: malakoi e arsenokoitai. Há dezenas de traduções para ambas as palavras, o que prova a incerteza dos eruditos sobre o que elas realmente significam no texto paulino. Palavras e termos como “devassos”, “travestis”, “catamitos”, “prostitutos masculinos”, “sodomitas”, “afeminados”, “pederastas” e “pedófilos”, dentre vários outros, já foram utilizados para traduzir malakoi e arsenokoitai.
      Malakos (plural malakoi) aparece em outros textos bíblicos e significa, literalmente, macio, suave ao toque, mole. No texto de Paulo adquiriu um significado metafórico, figurado. Os dicionários teológicos associam malakos a um homem afeminado, mas também reconhecem que o termo pode significar pessoas em geral dadas aos prazeres da carne. Tal tradução é bem mais coerente pois todos os outros pecados citados ali se referem a pessoas em geral, tanto homens quanto mulheres. Algumas traduções como A Bíblia de Jerusalém (em português), La Bible du Semeur (em francês) e a Contemporary English Version (em inglês) já apresentam essa idéia. Há estudos que relacionam malakoi com a prostituição masculina praticada na época de Paulo, principalmente em Corinto, cidade famosa por sua depravação sexual. Algumas traduções como a “Today’s New International Version” (2001), a “New International Reader’s Version” (1996) e a “New Century Version” (1984) apresentam essa idéia. Embora não completamente precisas, essas traduções já representam um avanço ao dissociar os pecados dos malakos da homossexualidade moderna.
     Apenas o o vocábulo “arsenokoitai” se refere exclusivamente a homens, pois em sua composição temos “arseno” que significa literalmente homem. Koitai significa “leito”, “cama”, numa conotação sexual. Portanto, arsenokoitai, significa o homem que mantém relações com outro homem ou, mais precisamente, o homem que penetra outro homem. Na época de Paulo, era comum a prática da exploração sexual, principalmente na relação senhor/escravo. Em Timóteo, Paulo menciona, juntamente com arsenokoitai, os traficantes de jovens escravos, o que reforça tal interpretação. Algumas traduções, valendo-se desse fato sócio-histórico, traduziram arsenokoitai como “pederastas” (Bíblia Viva – 1995) e “pedófilos” (Bíblia dos Capuchinhos – 2002). Tais traduções, ainda que não completamente exatas, são coerentes com o contexto social do século I, pois revelam um caráter abusivo em tais relações.  Essa era a visão judaica do comportamento sexual romano: a violência, o abuso e a prostituição. Paulo, por ser judeu, cultivava tais conceitos.
    Talvez nunca saibamos o que tais palavras significam, porém, é evidente que não se referem às relações homoafetivas e monogâmicas da atualidade. O que Paulo condena em tais textos é o sexo abusivo, cometido por solteiros (fornicação) fora do casamento (adultério) e o abuso entre homens. Outro ponto a ser considerado é o seguinte: se tal texto condena a homoafetividade, por que não menciona as mulheres? Que o respondam os cristãos homófobos.
Bíblia e Homoafetividade V
Romanos 1. 26 e 27: Idolatria e Ritos Orgíacos

Antigo templo romano
      Para uma análise e uma interpretação coerentes deste texto bíblico, precisamos lançar mão de dois dos principais princípios da hermenêutica e da exegese: o contexto textual e sociocultural.
     Quando analisamos o contexto textual, percebemos que os versículos 26 e 27 de Romanos 1 têm o seu conteúdo específico iniciado a partir do versículo 18: a impiedade dos homens e a supremacia de Deus em relação à Criação. A idolatria é um dos temas centrais, o que fica evidente pelos versículos 23 a 25. O Versículo 26 inicia-se com a expressão “por isso”, ou seja, o que está explícito a partir desse ponto é o resultado das ações humanas descritas nos versos anteriores.
     A sociedade romana se destacava pelo seu grande panteão, o que a colocava como um dos povos mais idólatras da época. Paulo, no texto em questão, faz uma análise das conseqüências negativas resultantes dessa prática tão abominável diante de Deus. Uma das práticas relacionadas aos cultos idolátricos era a prostituição cultual. Ali, homens heterossexuais se envolviam em rituais homossexuais, o que justifica a expressão: “deixaram a relação natural com a mulher”. Ou seja, homens heterossexuais, trocaram uma conduta sexual que lhes era natural por uma conduta contrária à sua natureza, ou seja, uma prática homossexual.
        Quanto à homossexualidade feminina, o texto de Paulo não é definitivo em afirmá-la, havendo, inclusive, quem acredite que Paulo mencionava o sexo anal. Essa interpretação perdurou durante toda a idade média. Tudo indica, porém, que Paulo esteja fazendo uma alusão a duas cerimônias: a de Dona Dea, a boa deusa e às bacanais: Nas cerimônias da boa deusa, restritas às mulheres, era comum a prática de cópula com animais. Nas bacanais, o incesto era parte dos ritos de iniciação.
      O texto faz menção a relações contrárias à natureza praticadas em um contexto bastante específico: a adoração de ídolos. Nenhuma menção há sobre as relações homoafetivas e monogâmicas da sociedade atual.
     O texto fala de homens e mulheres que praticaram perversões sexuais específicas, algo explicitamente contrário a sua natureza, ou seja, mulheres praticando sexo com animais ou com pessoas da mesma família bem como homens heterossexuais praticando atos homogenitais entre si . Os homossexuais masculinos nunca “deixaram a relação natural com a mulher” (v.27), simplesmente porque isso nunca lhes foi natural, portanto, constitui erro utilizar Romanos 1. 26 e 27 para condenar os homossexuais, sejam homens ou mulheres.
Bíblia e Homoafetividade VI
Sobre Eunucos e Eunucos
Por Alexandre Feitosa

O ator André di Mauro como o eunuco Hegai na minissérie A história de Ester, exibida pela Record
Chegou até nós um texto bastante interessante acerca das palavras de Jesus ao mencionar os eunucos em Mateus 19.12. O seguinte comentário refuta a interpretação que a Teologia Inclusiva traz sobre a questão. Transcrevemos os trechos mais significativos:
         “O eunuco pode ser o homem que nasce sem a capacidade natural de ter relações sexuais e gerar bebês (como, infelizmente, às vezes ocorre com pessoas que nascem com graves deficiências nos órgãos genitais ou nascem sem esses órgãos). Tal caso não se aplica ao homossexual, que pode tanto ter relações sexuais normais quanto gerar bebês, se optar por um casamento natural. E ser eunuco está longe de significar ser efeminado ou sodomita. Quando fala de eunucos, Jesus sem dúvida se refere à situação infeliz dessas pessoas.”
Resposta da Teologia Inclusiva:
       Jesus não disse que tais eunucos de nascença são incapazes de manter relações sexuais e gerar filhos, ele se limitou a dizer que “nem todos poderiam receber aquele conceito” (v.11), ou seja, o conceito do casamento heterossexual, apresentado no contexto.
      Jesus era judeu e falava para judeus. Então, é necessário conhecer o que o termo “eunuco” significava na cultura judaica. Não se pode desconsiderar o contexto sociocultural e lingüístico. Muitas questões bíblicas só são corretamente compreendidas e interpretadas quando se leva em conta as questões culturais. Uma nota do Novo Testamento King James esclarece:
    “O judaísmo conhecia apenas duas categorias de eunucos: Os ‘feitos pelo homem’ (em hebraico sãrïs ‘ãdhãm) e aqueles que nasceram congenitamente incapazes ou sem libido (instinto e desejos sexuais) chamados de ‘natural’ ou ‘eunuco do sol’ (em hebraico sãrïs hammâ)”.
     Portanto, além de homens que nasciam congenitamente incapazes, os eunucos também eram aqueles que nasciam sem libido, ou seja, instintos e desejos sexuais para com o sexo oposto, realidade muito mais freqüente que as deficiências congênitas. Não é preciso nenhum esforço para entender que tais eunucos eram na verdade homossexuais masculinos, e tais homens eram reconhecidos na cultura judaica sem que nenhum caráter pecaminoso fosse atribuído à sua sexualidade.
Clemente de Alexandria, (150-215 d.C.) um dos pais da Igreja, assim interpretou Mateus 19.12:
    “Alguns homens, desde o seu nascimento, têm uma natureza a afastar-se das mulheres, e aqueles que o eram naturalmente faziam bem em não se casar. Estes são os eunucos a partir do nascimento.” (Stromata, III 1.1)
    Dentre as características para se identificar um eunuco de nascença, o Talmude (compilação de escritos rabínicos que perde em importância apenas para a Torá) cita os modos frágeis, pouca barba, a suavidade do cabelo, da pele e a voz efeminada. Nenhum dos seus testes envolve a verificação da presença de defeitos anatômicos nos órgãos reprodutores. Inclusive, tais eunucos eram associados comumente com o desejo homossexual.
     Outro trecho do texto que julguei importante e carregado de preconceito:
   “Agora, Ebony, como interpretar que um homossexual pode ser eunuco por amor ao Reino de Deus? Será que também poderíamos incluir nessa interpretação um assassino não matar por amor ao Reino de Deus? Ou um adúltero não adulterar por amor ao Reino de Deus? Ou um pedófilo não violentar crianças por amor ao Reino de Deus? Faz sentido pensar dessa forma?”
     Nesse trecho, a ignorância ou a tendenciosidade falam alto. O autor do texto compara a homossexualidade a crimes como homicídio, adultério e pedofilia. A homossexualidade não é algo voluntário como assassinar alguém ou cometer adultério, esse fato por si só já desqualifica os argumentos preconceituosos desse texto.
    Os homossexuais, quer homens ou mulheres, não estão privados de vivenciar sua afetividade de maneira plena. Não há nada na Bíblia que condene o exercício dessa afetividade entre pessoas do mesmo sexo, antes, o próprio Jesus reconhece a existência das pessoas que não estão aptas para o casamento heterossexual.

Bíblia e Homoafetividade VII
Eunuquismo e homossexualidade: uma releitura bíblica

        É consenso que a Bíblia não apresenta o conceito de homossexualidade tal qual o conhecemos. Entretanto, há relances que aludem implicitamente aos homossexuais nas Escrituras. Essa constatação é possível na figura dos eunucos. Não estou afirmando que o eunuquismo e a homossexualidade são termos sinônimos. Esses homens ocupam uma posição especial em Isaías 56, representando a classe dos sexualmente excluídos na Antiga Aliança, entretanto, o profeta os destina a uma promessa grandiosa de inclusão ao povo de Deus.
           A figura do eunuco é decisiva nas palavras de Jesus no relato de Mateus 19.12. Visto que o único modelo de casamento da época era heterossexual, é óbvio que Cristo não poderia fazer qualquer referência a relações homoafetivas. A noção de orientação sexual na cultura judaica inexistia, Cristo usou um conceito que para nós seria rudimentar, mas que se relaciona diretamente à homossexualidade. Como assim?
          Embora a história ateste alguns casos de relações homossexuais envolvendo eunucos, o conceito geral da Antiguidade Judaica era o de que eunucos não se casavam. Isso se relacionava intimamente à sua função primordial, não única: a guarda das mulheres. Cristo separa muito bem os tipos de eunucos: os de nascença; os feitos pelos homens; e os que se fazem eunucos pelo reino. A nós interessa o primeiro tipo: o eunuco de nascença.
      A análise do termo usado por Cristo deve ser feita de acordo com o contexto sociocultural e linguístico da época. Os judeus conheciam dois tipos de eunucos de nascença, chamados especificamente de “eunucos do sol”. Eram assim chamados, pois nunca viram o sol sob outra condição, a não ser a de eunucos. Os eunucos do sol podiam ser homens com problemas congênitos ou homens sem libido que os impossibilitava ao casamento com uma mulher.
       Segundo o Talmude, tais eunucos se caracterizavam pelos modos frágeis e femininos. Clemente de Alexandria, um dos pais da Igreja (século II), reafirmou que a visão judaica sobre tais eunucos os associava a homens que naturalmente se afastavam das mulheres. Esse “afastar-se naturalmente das mulheres” não indica apenas a falta de libido puramente, mas indica a falta de libido POR MULHERES. O contexto da fala de Jesus é o casamento heterossexual. O Novo Testamento judaico (Editora Vida) se refere aos eunucos de nascença como homens que nasceram sem o desejo deste casamento, ou seja, entre homem e mulher. Parece-me bastante claro que os eunucos do sol também incluíssem os homossexuais, ou melhor, se refiram a eles já que estes são bem mais numerosos que homens congenitamente incapazes. Sendo assim, a homossexualidade torna-se inata e isenta de pecado. Sabe-se que a homossexualidade pode ter vários fatores em sua constituição, porém, a experiência dos homossexuais a situam ainda na infância, quando não há condição de escolhas sexuais conscientes. Embora a ciência apresente apenas indícios da origem da homossexualidade, o conceito de Cristo é o que deve prevalecer para o cristão homoafetivo.
      Como percebemos, Cristo falou sim sobre pessoas homossexuais, não com a mesma complexidade que conhecemos hoje, claro, o mais importante é que ele não atribuiu nenhum caráter pecaminoso à condição sexual de tais pessoas.

Mais detalhes sobre o tema estão disponíveis no livro Bíblia e homossexualidade: verdade e mitos. * O Conteúdo aqui exposto tem prévia autorização do Autor 
reprodução igreja nova vida - fonte: site do ministério shekinah mundial-http://skmundo.com.br/sede/?page_id=893

2 comentários:

  1. Esse estudo não convence nem o mais simples conhecedor das Sagradas Escrituras. Penso que cada defensor da prática da homossexualidade deve examinar a sua própria consciência. qualquer com um pouco de conhecimento pode distorcer qualquer parte das escrituras para justificar suas intenções. Mas, a Palavra Sagrada já afirma: "seja Deus verdadeiro e mentiroso todo homem". Não esqueça, Deus haverá de prestar contas com cada um. Quem o resistira?

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    1. Você já examinou a sua meamigo, pois a própria carta de Paulo aos Romanos que fala desse "erro" se refere também aos "juízes" que querem se colocar no lugar de Deus achando que podem julgar o seu próximo mas não podem, percebem? Digo isso porque os pecados relatados em Romanos capítulo primeito, não é somente o de sodomia mas muitos outros. O mesmo livro de Romanos, no capítulo 6 informa que todos nós pecamos, ora; se todos pecamos, como então eu poderei fazer o papel de juíz? Isso é contraditório. Qual é o seu papel aqui? De amar ou julgar. Será que tu que julgas não fases o mesmo, assim como está escrito no fim do capítulo um e começo do capítulo dois? Nunca cometeu erro. Além do mais, pelo que eu percebi nesses textos foi que ouve um erro de interpretação bíblica ao longo do tempo não foi isso? Se acha que os comentadores estão errado, então apresente suas razões com evidências bíblicas, históricas, científicas; assim como eles fizeram e pare de se bitolar em frases que já são jargões de pessoas tradicionais que acham mais fácil ficar repetindo as mesmas coisas do que conhecer a verdade. Abraços.

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