A nossa resposta ao preconceito é abrir igrejas inclusivas mostrando que pessoas podem ser aceitas e felizes,
Paulo Mendonça, pastor da Igreja Nova Vida, em matéria publicada no jornal O Imparcial, neste último Domingo14/04/13.
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Pastor Paulo Medonça busca explicar aos seguidores que a palavra de Deus é inclusiva e não preconceituosa. |
Os olhares desconfiados, os questionamentos, a insistência para ‘mudar’ e
o preconceito. Situações que levaram um grupo de homossexuais a criar
espaços próprios para exercer sua religiosidade. Com isso, São Luís
ganhou três templos gays – como os próprios denominam. Nestes locais, os
grupos louvam a Deus e podem ser quem são, segundo defendem, e sem o
que consideram interferências ou curiosidade exacerbada, o que os
incomodava. Os templos existem há mais de 10 anos, no entanto, são pouco
conhecidos e divulgados. São as auto-denominadas igrejas inclusivas –
frequentada pela comunidade GLBT, mas aberta a todo cidadão.
A
igreja segue uma filosofia em que não tratam e nem vêem a
homossexualidade como doença a ser curada. A Comunidade Cristã Nova
Esperança, localizada no Monte Castelo, foi a primeira igreja gay a ser
aberta na capital; o templo Chamado de Última Hora, no Cohatrac, possui
mais de cinco anos de criação; e a igreja Nova Vida, na Beira Mar,
próximo à Reffsa, completou cinco anos de atividades.
A
reportagem de O Imparcial visitou o templo Nova Vida e conversou com o
pastor Paulo Medonça. Ele conta ter frequentado uma congregação
evangélica por três anos. “Eu tinha um incômodo com os gays porque eles
eram livres e eu não podia ser, pois precisava ter um tipo de
comportamento dentro da congregação”, relata. Paulo chegou a exercer as
funções de professor e conselheiro. Segundo ele, o tratamento começou a
mudar quando ele iniciou um relacionamento com outro membro da igreja,
chegando ao conhecimento de todos.
“A partir daí eu senti que me
viam de outra forma. Desconfortável, eu me afastei das funções que
assumia na igreja e, com o passar do tempo, eles me excluíram”, afirmou.
Mas, para ele, o que poderia ser motivo de tristeza ou decepção, se
transformou em motivação para seguir em frente e construir “uma obra”.
“Se isso não tivesse acontecido naquele momento, eu não faria algo maior
que Deus tinha guardado para mim”, diz ele, se referindo ao templo que
hoje coordena e às pessoas que vêm mobilizando para a evangelização.
A
igreja Nova Vida nasceu da ideia de três amigos que queriam continuar
louvando a Deus e praticando sua fé, mas não queriam ser alvo de
preconceitos. Era uma pequena casa e os cultos, realizados com todos
sentados no chão. Aos poucos, os amigos foram informados do templo e
viram se tratar de um espaço apto para louvor, diz o pastor. Hoje, são
cerca de 40 membros e funciona em uma sala no Edifício Sousa Center, na
Beira Mar. Paulo Mendonça explica que o crescimento da Nova Vida é
impulsionado, principalmente, pelo preconceito sofrido por este grupo e
que expulsa os fieis gays, lésbicas, travestis e transexuais das
igrejas. “A nossa resposta ao preconceito é abrir igrejas inclusivas,
mostrando que todas as pessoas podem ser aceitas e felizes”, justifica.
O
quadrinhista Sullivan Suad, de 29 anos, frequenta a Nova Vida desde o
início e por um ano foi resistente a se unir ao grupo. “A curiosidade me
trouxe e me manteve na igreja”, conta ele, que era católico pouco
praticante. A maior barreira ele conseguiu romper: tem o conhecimento e
apoio familiar.
A igreja, diz ele, foi o complemento que faltava
para uma vida completa. “Participar do grupo e das atividades me fez
ver que Deus veio para todos, que Deus ama a todos nós. Tenho
consciência de quem eu sou, da minha fé e que estou no caminho que Deus
preparou para mim”, disse ele. Além de frequentador, Sullivan colabora
com sua arte de desenhista e auxilia na mobilização de mais membros, a
fim de fortalecer a congregação.
Atividades
A
Bíblia utilizada pelas igrejas inclusivas é a mesma do catolicismo e do
protestantismo. Quando perguntado sobre as passagens da Bíblia que
referem à homossexualidade, pastor Paulo explica que tais mensagens, por
vezes, são colocadas aos fieis de maneira a prejudicar o homossexual.
“O que vemos são as igrejas fazerem várias modificações na Bíblia com o
intuito de acusar os homossexuais”, diz.
Ele ilustra, defendendo
que “na Bíblia tem muitas mensagens que não são seguidas”. Pastor Paulo
cita o Novo Testamente em uma das passagens de Coríntios 1:14, 32, onde
diz que a mulher não pode se manifestar na igreja. “Mas, há muitas
pastoras”. Justifica ainda com outra passagem que diz que o “homem não
deve usar a navalha (fazer a barba)”.
Para desmistificar os
ensinamentos que prejudicariam os gays, o pastor tem uma estratégia.
“Temos um programa de estudos, quatro por mês, onde trabalhamos os
textos isolados e tentamos explicar ao membro do grupo que a palavra de
Deus é inclusiva e não preconceituosa”, argumenta.
Na
congregação Nova Vida há, além dos cultos, os louvores, a adoração com
banda de louvor, palestras, retiros espirituais, pregações e as ofertas e
dízimo. “Fazemos tudo que qualquer igreja faz. O que queremos é pregar a
palavra a todos. Deus disse: ‘vinde a mim todos, que eu vos aliviarei’,
ou seja, todos. Ninguém é excluído ou impedido de professar sua fé”,
reitera. A Nova Vida tem cultos quartas, sábados e domingos e dispõe do
blog igrejanovavidaslz.blogspot.com, para quem quiser conhecer um pouco
mais.
Entendimentos
Os homossexuais estão em
todas as partes e são destaque na mídia, tendo nesta uma grande
ferramenta para fazer valer seus direitos como qualquer ser humano,
segundo observa a psicóloga Anamaria Batista Ferreira. “Não podem ser
ignorados porque são parte dessa sociedade e, como reitero, com os mesmo
direitos de qualquer cidadão”, diz.
Ela destaca os movimentos
como as paradas gays e o surgimento de ongs específicas. Dessa forma,
diz, a sociedade começa a despertar um sentimento de solidariedade com o
movimento, transformando-se em simpatizante. “O que se deve pensar é
que se forma uma corrente para a eliminação de todos os tipos de
preconceitos, inclusive o de gênero”, pontua.
Considerando a
questão propriamente religiosa, segundo a psicóloga, não há intenção de
desfazer dos documentos e bases das religiões. “Mas, há que se pensar,
conforme as próprias religiões pregam, que somos todos cristãos e sendo
assim, temos fé e o direito de exercê-la”, conclui.
Em
contrapartida a este movimento vertente do meio evangélico, há os
cristãos e líderes que entendem que as igrejas inclusivas ignoram o
evangelho que liberta e transforma o homem. Ou seja, para estes líderes,
ocorre uma interpretação usual, onde os responsáveis pelas igrejas
inclusivas tentam reinterpretar as declarações paulinas, aplicando-as
aos dias atuais, onde a homossexualidade tornou-se já parte comum do
cotidiano das grandes cidades.
Estudiosos, por sua vez, avaliam
que este comportamento sexual vem de fatores psicossociais vividos na
infância, até os cinco anos de idade, principalmente. “Estes estudos
defendem que tais fatores acarretariam traumas e complexos, podendo
levar o indivíduo a desenvolver o homossexualismo durante sua vida”,
explica a psicóloga Anamaria Batista Ferreira.
Segundo o padre e
coordenador da Pastoral da Arquidiocese de são Luís, Crizantonio da
Conceição Silva, a Igreja Católica Apostólica Romana procura, acima de
tudo, valorizar a pessoa humana. “Essa valorização independe da
orientação sexual, partido político ou time de futebol, mas, o intuito é
valorizar a pessoa”, reforça.
O padre cita o documento
Homosexualitatis, escrito pelo papa João Paulo II, onde este afirmava
que ‘a inclinação da pessoa ao homossexualismo, apesar de não ser em si
mesma um pecado, constitui, toda via, uma tendência mais ou menos
acentuada para um comportamento intrinsecamente mal, do ponto de vista
moral, por este motivo, a própria inclinação deve ser considerada como
objetivamente desordenada’. Diz ainda que ‘o ato sexual está a favor da
vida e que a finalidade é procriação, e a relação sexual com o mesmo
sexo vai contra a questão da vida’.
“O catolicismo orienta que
homossexuais procurem uma vida voltada para a castidade e tentem se
conter diante de seus prazeres, emoções e desejos carnais”, reitera.
Lembra ainda as passagens bíblicas, livro que rege a religião católica,
que condenam a prática.
O padre explica que as questões da
homossexualidade vão levando o ser humano a uma prática desregrada do
sexo e se apoia ainda no Catecismo da Igreja Católica, documento-base da
Igreja. No número 2358, o Catecismo coloca o homossexualismo como uma
provação na vida destas pessoas e que a igreja deve acolher com respeito
e sem preconceito. “O Catecismo entende que os homossexuais também são
convocados a levar a mensagem de Cristo como qualquer outra pessoa”,
conclui.
O Imparcial
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